quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Método de treinamento de guitarra: A tartaruga e o coelho

Esse título pode ser um tanto inapropriado, pois o que vou falar aqui não se trata propriamente de um método, mas sim de consciência e disciplina.



Seria muito simples vir aqui e começar a escrever um monte de dicas práticas sobre treinamento técnico. 

Então eu começaria falando sobre palhetada alternada, sweep pickingtapping e etc... Aff!, a internet já está bem cheia disto. Não estou negando o valor de estudar estas técnicas, nem que sem treiná-las é possível alcançar uma elevada performance  técnica.

Contudo, há alguns fatores e considerações por trás de todos estes treinamentos técnicos que vão fazer com que poucas horas de estudo ofereçam um rendimento infinitamente superior ao que normalmente se consegue com várias horas de treinamento inadequado.

Não estou me colocando na posição de um "fritador". Isto está longe de ser o que sou como guitarrista, mas ainda posso chegar lá. Apenas prefiro percorrer um caminho mais longo, porém duradouro. Muitos guitarristas treinam certos licks à "velocidade da luz". Isto pode ser até ser produtivo, mas tem suas limitações. Já tive a oportunidade de conhecer alguns ótimos guitarristas que tocam em velocidades moderadas, e outros guitarristas que tocam como se estivessem na formula 1, mas que apenas são medianos.

Antes que eu seja apedrejado, quero deixar bem claro que meu entendimento do que é ser mediano ou ser ótimo não consiste em tocar mais ou menos rápido, mas sim em tocar com clareza e boa interpretação. Afinal de contas é o que as pessoas ouvem e a capacidade de se emocionarem com uma música que realmente defini não apenas um guitarrista, mas qualquer outro músico como excelente.

Tocar com clareza e ter boa interpretação é resultado de um fator que deve ser observado por qualquer músico: a consciência da execução. Se ao executar uma música, uma frase, ou até mesmo uma única nota soando por um longo tempo sobre um acorde, o músico tem consciência de como está interpretando este som no instrumento, com certeza a sensação despertada no ouvinte será marcante. 

Pense nas músicas dos Beatles, Pink Floyd e Rolling Stones, que não exigem um alto grau técnico e nem mesmo tocar em BPMs rápidos. O que estas três bandas têm em comum é que sabiam colocar as melhores notas sobre os acordes certos e nos tempos certos. Além disto, interpretavam de maneira única seus arranjos. A consciência que tinham da importância de cada nota tocada fez com que ficassem sempre presentes em nossas memórias.

Se uma interpretação consciente da música a torna especial, imagine aliá-la a um alto nível de execução técnica. A música For the love of God, de Steve Vai, é um exemplo clássico dessa combinação. Uma perfeita execução técnica, aliada a uma ótima interpretação e consciência musical. É o que faz com que tanto os guitarristas fritadores quanto os guitarristas do "feeling" coloquem esta música em tão alto patamar.

Uma boa interpretação exige calma, mas tocar rápido requer movimentos desesperados dos dedos, movendo se loucamente por toda a escala do braço da guitarra, como se fosse arrancar faíscas e romper as estruturas atômicas do metal das cordas, e em seqüencia se projetar no infinito irrompendo a atmosfera terrestre, certo? não, errado. Tocar rápido, da mesma forma que interpretar bem, exige calma, concentração, treino e por último, automatização.

O primeiro passo para automatizar os movimentos é ter consciência deles. Para adquirir consciência, não há método melhor do que executá-los calmamente, lentamente, visualizando os dedos cada vez que eles se movem, corrigindo erros e utilizando a criatividade para encontrar maneiras de realizar menos esforço para obter mais resultados. 

Esta, por exemplo, é a lógica do Sweep Picking. Este processo é gradual, e deve partir de estudos em andamentos lentos e que vão aumentando gradualmente, até se conseguir tocar em andamentos rápidos de forma quase que automática, porém consciente.

Metrônomo: moçinho e bandido

Grande parte dos guitarristas que conheço têm duas opiniões bem distintas a respeito do metrônomo: Alguns o louvam e outros o odeiam. A argumentação de quem o odeia parte do princípio de que ao tocar em uma banda, você tem de seguir os outros músicos, e não um metrônomo. Argumentam ainda que o metrônomo é uma coisa chata, mecânica e repetitiva. Parece-me que não pensam em resultados a longo prazo.

Já os que o adoram têm mil e um argumentos em defesa desse aparelho. Dizem que ele permite acompanhar o desenvolvimento técnico em números, a medida que pode-se se tocar uma mesma frase ou exercício em andamentos mais rápidos. Afirmam também que possibilita desenvolver um melhor senso rítmico e que é excelente para um estudo disciplinado, além de servir como guia do baterista dentro do estúdio de gravação. É um pensamento baseado na importância da consciência da execução.

Particularmente, ao mesmo tempo concordo e discordo com a parcela que o odeia, pois é chato, mecânico e repetitivo, mas justamente essas características é que o tornam uma ferramenta indispensável para um bom desenvolvimento técnico do músico e monitoramento de resultados.

A fábula da corrida entre a tartaruga e o coelho

Quem se lembra da fábula da corrida entre a tartaruga e o coelho sabe que o coelho sai disparado na frente da tartaruga, mas tem tanta certeza de que não vai perder a corrida, por ser mais veloz, que para em um trecho da pista para descansar e acaba dormindo. Quando acorda vê que a tartaruga está chegando na reta final e por mais veloz que o coelho corra não poderá mais ganhar a corrida.

O treinamento técnico parte mais ou menos do mesmo princípio. Melhor começar a treinar o que tem dificuldade lentamente, em andamentos em torno de 70 Bpm, aumentando gradualmente de 2 em 2 bpm até alcançar a velocidade desejada. Assim, você consegue adquirir precisão e consciência nos movimentos. 

É importante também que os treinamentos sejam feitos contando os grupos rítmicos (sextinas, colcheias, semicolcheias, tercinas, quiálteras) de forma consciente, pois isto o ajudará a tocar mais rápido, uma vez que estará ordenando o seu pensamento, em vez de ficar jogando notas em ritmos aleatórios e descontínuos.

Outro ponto muito importante do treinamento técnico, principalmente quando fala-se em escalas, é criar padrões de fraseado que o ajudarão a automatizar os movimentos dos dedos e também criarão movimentos melódicos característicos, que passarão a fazer mais sentido ao ouvido.

A mão da escala deve ser bem veloz, a outra apenas palheta...

Talvez, este seja um dos piores mitos quanto à técnica de guitarra, que é extremamente "válido" para iniciantes que enxergam a mão da escala como a "mão da velocidade", e a mão que dedilha ou palheta como uma espécie de muleta.

Ora, num instrumento tão complexo de executar quanto uma guitarra, as duas mãos têm de estar funcionando em sincronia. Logo, não adianta a mão da escala conseguir tocar uma frase em sextinas a 140 bpm se a mão que palheta as cordas não tem habilidade compatível. Neste contexto, a falta de habilidade de uma das mãos pode até ser um empecilho, a partir do momento em que bloqueia o movimento natural das cordas. Isto fica nítido quando o guitarrista tenta tocar uma nota e sai aquele som percussivo de  "tic".

Então, além de pensar como a tartaruga, não se esqueça de caminhar movendo uma perna de cada vez em um ritmo sincronizado, porque se você tentar mover as duas de uma só vez o risco da queda é certo.

Observe seus ídolos, pesquise bem sobre acessórios e equipamentos

Palhetas de diferentes tamanhos, formas e calibre influenciarão consideravelmente não apenas no seu timbre, mas na maneira como você palheta e na velocidade que pode alcançar, ou seja, em sua técnica.  Tudo isto é válido principalmente quando pensamos na mão da palheta.

Cordas boas, pontes, braço e tarraxas bem reguladas influenciarão demais talvez não na maneira como toca, mas no seu desenvolvimento técnico. Quando os defeitos do instrumento atrapalham você não consegue obter 100% do seu potencial, pois deixa de focar nos exercícios para prestar atenção nos defeitos da sua guitarra.

Como última dica, tente observar os movimentos que seus guitarristas preferidos costumam executar, bem como a postura das mãos. Tente fazer de forma igual, ou no mínimo semelhante, pois tentar movimentar suas mãos e dedos da forma como seus ídolos fazem pode fazer com que você descubra movimentos que exigem menos esforços e oferecem melhores resultados. Pense bem, seus ídolos gastaram muito tempo de estudo até chegarem em uma postura de mão ou estilo de movimentação que consideram ideais.

Acredito que cada um atingirá melhores resultados com uma movimentação e postura específica das mãos. Alguns guitarristas descansam a mão sobre a ponte da guitarra, outros a deixam suspensa no ar, sobre as cordas, apoiam o dedo mínimo abaixo da corda Mizinha, etc... Uns movimentam bastante o punho, outros deixam o punho reto e movimentam o antebraço, alguns apenas as pontas dos dedos.

Tenha paciência, adquira consciência e com um pouco de força de vontade você certamente alcançará seus objetivos. Boa sorte!

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